Dí Maria e o capricho irrecusável

O meu amigo Salvador é um apaixonado por motas. Delira com todas; das clássicas, às de competição, passando pelos modelos mais aborrecidos e de potência zero. Se o rapaz pudesse, tinha uma garagem composta por uma frota capaz de fazer concorrência à de Clarence Seedorf, ex-futebolista que até teve uma equipa num Moto GP qualquer. Há uns tempos, mesmo sabendo que torço o nariz ao tema, pegou no assunto e falou de uma possibilidade que havia surgido: "um capricho irrecusável", na sua opinião. Tinham 'oferecido' ao Salvador uma Honda CBR-600 F, preta, de 2011 e com menos de 10.000km, por apenas 4200€. "É uma máquina ao meu alcance", comentava comigo enquanto se lhe arregalavam os olhos como quando íamos ao hípermercado e parávamos na secção dos brinquedos.

No entanto, o Salvador, que na sua cabeça já percorria o asfalto montado na Honda, estava a ignorar circunstâncias familiares. O Salvador é casado, tem um filho, aguarda outro, e sabe, melhor que ninguém, que um utilitário serviria melhor a esposa e a pequenada. Nem vamos falar dos gastos. Do ponto de vista meramente prático, ter uma mota na garagem, ao invés de um 'Corsa' qualquer, é de uma lógica aberrante, e foi mesmo isso que lhe transmiti. Por mais que o negócio da moto fosse estupidamente sedutor.

Salvo as devidas diferenças e distâncias monetárias, o Real Madrid também está a ceder ao capricho e, com isso, a arruinar as ambições desportivas desta época. Di Maria, um jogador perfeitamente imperfeito e com um dom especial para aparecer nos partidazos, estás prestes a passar à história. O 'Fideo', máximo responsável pelo Mundial de sonho da Argentina e elemento crucial na táctica de Ancelotti na conquista da 'décima', rapidamente percebeu que, após a chegada de James, não lhe restava outra alternativa que começar a esvaziar o armário em Chamartin.

Estamos a horas da confirmação da sua chegada a Old Trafford. Se olharmos apenas para o lado financeiro da operação, é complicado arranjar 'mas' convincentes. Mas, e talvez seja a reticência que mais peso tem, Madrid, depois da glória suprema em Lisboa, começa a ficar saturada da prioridade comercial que o Real coloca em cada negócio. Substituir um jogador feito, perfeitamente identificado com um sistema de jogo de sucesso e capaz de rasgar a defesa mais fechada, por um James que ainda não se provou numa liga com a dimensão física da espanhola, é um risco completamente desnecessário. Mesmo que o colombiano, que custou mais uns milhões que aquela Honda, fosse um capricho irrecusável.

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