Awer Mabil ( Adelaide United, A-League): do campo de refugiados a coqueluche australiana

Passaram exactamente dez anos sobre a decisão favorável da Confederação Asiática de Futebol incluir a Austrália nos seus quadros competitivos. Como crónico vencedor oceânico, todos lucraram com o objectivo e decisão dos 'cangurus'. Se, por um lado, a Austrália fugia à crueldade de um 'playoff' com o quinto classificado da fase de qualificação sul-americana - que apura directamente os quatro primeiros na zona da CONMEBOL - por outro, ter a oportunidade de crescer competitivamente no continente asiático, era o salto qualitativo que a Austrália necessitava para afastar a modalidade do rótulo que começa a descolar, por exemplo, da MLS: o de campo de retiro de algumas das principais figuras europeias da última década e fazer explodir o jogo num território 'Aussie' que ainda oferece ao rugby a sua maior fatia de carinho (possivelmente sempre será assim).

Disputar a Taça Asiática, olhar nos olhos potências emergentes (EUA, Qatar, Iraque, China) e outras já justamente estabelecidas (Japão, Coreia do Sul, Irão), permitiu aos australianos disparar o foguete sinalizador de talento, e colocar o mapa 'austral' como um filão a explorar para futura extracção e polimento de pérolas. Um deles é Awer Mabil, uma espécie de protagonista-Cinderela dos tempos modernos. Nascido em kakuma (Quénia), o primeiro contacto que teve com uma bola foi feito por entre tendas dos imensos campos de refugiados que povoam a região. Em 2006, a sua família é levada para a Austrália, onde rapidamente detectaram as condições físicas privilegiadas de Mabil para que fosse possível integrá-lo no Centro de Elite Australiano (que alimenta as selecções jovens australianas), assinando posteriormente pelo Adelaide United, clube onde se estreou com a tenra idade de 18 anos e pelo qual se tem projectado esta temporada com um conjunto de desempenhos estonteantes na A-League.

Awer Mabil é um demónio da ala, uma representação em carne e osso de 'Taz', o diabo-da-tasmânia animado da 'Looney Tunes' que, num furacão demolidor aspirava metros. Velocíssimo, passa a sensação de ter sido forjado em latitudes (ainda) mais exóticas para ser um velocista de curtas distâncias. O poder de aceleração diabólico que demonstra não destoa da criatividade no drible, susceptível de se tornar uma imagem de marca de Mabil (ainda para mais em espaços reduzidos, sendo o atleta tão explosivo). Encaixando facilmente em qualquer um dos flancos, revela uma assinalável capacidade em prol do colectivo, característica tantas vezes tolhida e baça em extremos
atrevidos, talentosos, caindo facilmente na teia do egocentrismo. Apesar do discernimento táctico, Mabil não é uma fruta madura, necessitando de aumentar os índices de finalização e o timing do passe em zonas de concretização. Quando o fizer, o apetite de Mabil será proporcional ao de 'Taz', tornando a A-League demasiado curta para tamanha fome de novos desafios.

António Borges

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