Andrea Pirlo: "penso, logo jogo"




"Penso, quindi gioco" (Penso, logo jogo). Faço mea-culpa. Considero o recurso ao 'estrangeirismo', como adorno textual, um dos actos de presunção mais inúteis e desprovidos de classe. Mas estamos a falar de Andrea Pirlo, e, na sua língua materna, esse é precisamente o titulo da sua auto-biografia. Nem de propósito, ahm? Aos 36 anos, quando se pede a forja de novos ídolos - e na semana a que se presta a vencer a sua terceira 'Liga dos Campeões'- não poderia ser de outra forma. Quantas vezes este espaço se bateu pela importância suprema da inteligência em desprimor de outras características? No entanto, o tique-taque do processo evolutivo a meio-campo - por norma em crescendo do favorecimento muscular - é um compasso acelerado e que não afasta a temeridade que cada vez aproxima mais Pirlo de uma espécie em vias de extinção. Mas falamos de Pirlo. A subtileza não requer fibras musculares 'A' ou 'B'; a subtileza passeia-te da mesma forma num relvado cinco estrelas UEFA, como passearia naqueles 'ervados', desbravados pelas agruras temporais britânicas em meados dos anos 90. É Andrea Pirlo, insistentemente empenhado em demonstrar que, saber pisar, é mais importante que o simplista acto de o executar. 

Há poucos litigantes sobre a proporcionalidade do avanço da idade e a perda de faculdades mentais. Pirlo abomina a teoria, embora tenha a sorte de no banco ter um treinador como Allegri, observador privilegiado do estado de Andrea. Barba mais desgrenhada, pernas castigadas,o plano é simples e já recoloca a Juventus de novo no grade mapa do futebol europeu: Marchisio recua e reforça a intensidade que o mítico médio italiano já nem sempre empresta. Não porque se tenha esgotado a capacidade de ensinar futebol, mas porque as desculpas para oferecer alternativas começam a abundar. Se isso se assume como um boa ou má notícia, só os serões (desconfio que nostálgicos) de noites de Liga dos Campeões vindouras nos poderão esclarecer.

Pirlo é um futebolista em vias de extinção porque a sua espécie está a chegar ao fim. Verratti? Talvez. É demasiado novo, provoca arrepios em zonas proibitivas ( deixa-nos sempre com aquele sorriso escarninho de quem não sabe se está deliciado, ou aliviado) às quais só dávamos bênção para tal a Maradona ou, agora, a Messi. A banda continua a tocar. A sinfonia é afinada, como sempre, mas o ritmo parece querer subir vertiginosamente. Como em 'Whiplash', película onde um maestro completamente lunático exige 'só' a perfeição. Pirlo dar-lha-ia. Mas nunca sangraria das mãos, como o pobre do seu esbirro baterista . Nem precisaria. É Andrea, o maestro ainda é ele.

António Borges

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